quinta-feira, 24 de junho de 2010

ARQUEOLOGIA INDUSTRIAL
Falar de arqueologia, principalmente para um leigo, não é tarefa fácil. Falar de arqueologia industrial, é ainda mais problemático, pois a terminologia “industrial” foi anexa ao termo arqueologia nos anos 20 do séc. XX, embora já antes, nos meados do séc. XIX, se tenha usado um termo muito parecido, e que era: arqueologia da industrialização ou a conservação do património das indústrias.
«Por arqueologia industrial pode entender-se como o estudo das transformações técnicas e dos materiais [e equipamentos] relativos à industrialização».
Mas para que o referido estudo se torne viável, é imprescindível inventariar, registar, preservar e, eventualmente, reutilizar os monumentos industriais. Para o facto já o nosso Francisco de Sousa Viterbo - o pai da expressão «arqueologia industrial» - chamava a atenção, em finais do século passado:
«Antes que tudo se perca irremediavelmente, salvemos pela descrição e pela estampa o que ainda nos resta, dilacerado e partido, dos antigos documentos da laboriosidade portuguesa». E continua, um pouco adiante: «Não é só nos descantes, na linguagem, nas tradições, nos símbolos, nas parlendas, no viver íntimo, nos costumes, que o folklorismo [sic] poderá fazer uma colheita preciosa. A vida material, a vida do trabalho, anda intimamente ligada à vida psicológica, e uma e outra deveriam ser surpreendidas ao mesmo tempo no seu conjunto harmonioso».
Continuando, Sousa Viterbo faz uma observação que ainda continua, em grande parte, actualizada: «Exceptuando os descobrimentos marítimos, em que parece haver-se concentrado toda a sua actividade, no demais não me recordo de nenhum invento português que ficasse marcado assinaladamente nos anais da ciência e da industria. No entanto, esta falta deve atribuir-se também em grande parte ao nosso descuido proverbial, que deixa no esquecimento ou que não regista oportunamente qualquer demonstração, mais ou menos notável, da nossa aptidão científica ou do nosso engenho industrial e artístico»
É claro que, infelizmente, esta chamada de atenção e alerta de Sousa Viterbo, não foram ouvidas pelas entidades responsáveis do nosso país, pelo menos até meados do séc. XX. Muitos foram assim os monumentos industriais que se delapidaram, muitas foram as raízes de indústrias que vigoraram neste rectangular cantinho, que se perderam, sem que delas ficasse registado algo para a posteridade.
Assim sendo, deve ser sublinhado que falar de arqueologia industrial, não deve ser olvidada a parte em que a mesma é embutida no património cultural. É desta raiz que deve nascer a árvore que irá dar os seus ramos e os seus frutos na procura dos bens materiais e imateriais das indústrias, passadas e presentes, e na preservação e manutenção das estruturas remanescentes para que delas se faça um outro uso: o ensino e a divulgação do que foram, como foram e para que foram.






“José Amado Mendes
Doutorado em História Moderna e Contemporânea, pela Universidade de Coimbra, e mestre em Ciências da Educação, pela Universidade de Austin (EUA), é professor catedrático (aposentado) da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e colaborador da Universidade Autónoma de Lisboa. Tem-se dedicado à investigação de diversas temáticas, com destaque para as seguintes: história económica e social, industrialização, história empresarial, ética e cultura de empresa, liderança e cultura organizacional, museologia e património cultural, sobre as quais publicou várias obras. Foi Director do Curso de “Mestrado em Museologia e Património Cultural” e um dos organizadores do I Encontro Nacional sobre o Património Industrial (Coimbra – Guimarães – Lisboa/1986), cujas actas foram publicadas sob a sua coordenação. Foi membro e coordenador de um grupo de trabalho do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX – CEIS 20 e Presidente do Conselho Científico da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. É membro de várias associações científicas, nacionais e estrangeiras”.